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Sua história

© Veja Dedoc, 1996

Juventude na Polônia

Frans Krajcberg nasceu em 12 de abril de 1921, em uma família judia, na Polônia, na cidade de Kozienicé, uma pequena localidade situada a cerca de 210 km ao sul de Varsóvia. Sua família, modesta, era numerosa (cinco filhos).

A floresta era um refúgio para o pequeno Frans: era lá que ele se escondia para escapar do assédio de colegas de escola que o acusavam... de ser judeu.


“Na floresta (do meu vilarejo) eu encontrava o único lugar onde podia me questionar. Sofri demais, ainda criança, com o racismo cruel alimentado pela religião: aqueles fanáticos não aceitavam nada diferente. Eu me perguntava onde tinha nascido, por que ali e não em um país onde me odiassem menos.”

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Frans Krajcberg em 1945

Seu pai era comerciante de sapatos e sua mãe, Bina, uma militante comunista reconhecida dentro do partido polonês. Nos anos 1930, o Partido Comunista e os livros considerados tendenciosos foram proibidos na Polônia — o que apenas aumentou o espírito combativo de Bina, para quem “é pela instrução que passa a emancipação dos povos”.

Frequentemente presa, Bina Krajcberg levava adiante uma luta incansável. Foi enforcada pelos nazistas em 1939, no dia da declaração da guerra. Frans Krajcberg, então com 18 anos, reconheceu o corpo da mãe na prisão de Ramdam, perto de Varsóvia. Teve apenas tempo de recuperar o colar dela, que carregaria como um talismã por toda a vida. Sem dúvida, o caráter e as convicções de Bina influenciaram profundamente o filho: fugir do intolerável, lutar para sobreviver!

Após a morte da mãe, em 1939, perto de Varsóvia, Frans Krajcberg voltou para casa, em Kozienice. Não encontrou mais nenhum sinal de sua família. Foi aprisionado numa igreja onde os nazistas tinham reunido os judeus da aldeia. Conseguiu escapar correndo pela floresta. Atravessando uma saraivada de balas, conseguiu cruzar o rio e alcançar a liberdade.

A Rússia, a guerra, os campos

Com outros resistentes e sobreviventes poloneses, Frans Krajcberg junta-se ao Exército Polonês Vermelho, na União Soviética. Em Vilnius, ele conhece Mordechaj Anielewich, que lideraria a insurreição do Gueto de Varsóvia. Doente, é hospitalizado em Minsk e começa a pintar durante a convalescença. Em Leningrado, ingressa na Escola de Belas Artes e, paralelamente, cursa Engenharia Hidráulica. Aprende a falar russo.

Em Leningrado, Frans Krajcberg conhece Natacha, sua primeira grande paixão. Em 1941, o Reich ataca a URSS e cerca a cidade. Krajcberg foge do cerco nazista a Leningrado e, durante semanas, corre entre as bombas, preso entre o front alemão e o front russo. Natacha morre diante de seus olhos, na estrada para Minsk, enquanto estavam refugiados na floresta tentando escapar dos bombardeios.

Incorporado ao Primeiro Exército Polonês, ele é enviado a Tashkent, na Ásia Central, onde se torna inspetor técnico das barragens no Uzbequistão. Adota um nome falso para esconder suas origens judaicas. Em 1943, entra para o Segundo Exército Polonês como oficial encarregado da construção de pontes. Torna-se pontoneiro do Marechal Jukov.

Constrói a ponte que permitirá libertar a Polônia. Frans Krajcberg é o primeiro militar a entrar em Varsóvia libertada, marchando sozinho, à frente das colunas blindadas.

Com o Exército Vermelho, Frans Krajcberg é confrontado com a existência dos campos de concentração — o horror inominável que o marcará profundamente. Em julho de 1944, entra no campo de Majdanek, perto da fronteira russo-polonesa. Disseram-lhe que seus pais talvez estivessem ali. Ele toma consciência, no mais íntimo de seu ser, da dimensão da loucura humana. A imagem “daquelas montanhas de corpos, amontoados ao acaso”, onde talvez estivessem seus pais, o assombraria até o fim da vida.

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Frans Krajcberg no uniforme do Exército Polonês

Quando voltou para casa, o apartamento da família estava ocupado. Uma mulher bateu a porta na sua cara, chamando-o de “judeu sujo”. Ele decidiu nunca mais pôr os pés na Polônia. Jogou as duas medalhas que recebeu de Stalin por cima da fronteira tchecoslovaca e foi para Stuttgart, onde tentou uma última vez — sem sucesso — encontrar sobreviventes da família. Todos tinham morrido no Holocausto.

“Saí (do campo de concentração) em um estado de choque indescritível, mudo de horror (…) Toda vez que vejo o amontoado das árvores queimadas na Amazônia pelos homens, não consigo deixar de pensar nas cinzas dos fornos crematórios: as cinzas da vida, as cinzas do fogo dos homens que ficaram loucos.”

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1945_Histoires du Nazisme, 1945, gravue sur métal, 12x16cm, Stuttgart.png
1941_sans titre, encre sur papier, 30x40cm, Leningrad, URSS, 1941 (collection de l'artiste).jpg

Histórias do nazismo, 1945, gravura em metal, 12 x 16 cm, Stuttgart

Escola Bauhaus

Em Stuttgart, Frans Krajcberg aprende alemão. Estuda nas Belas Artes com Willy Baumeister (1889-1955), professor da Bauhaus que escolheu permanecer na Alemanha e resistir. Ele descobre essa criação de vanguarda diabólica para Hitler.

« O ensino de Baumeister era aberto, estimulante e generoso. Ele seguia o espírito da Bauhaus e nos ensinava todas as técnicas. Para ajudar os estudantes, Baumeister criou um prêmio que dava do próprio bolso. Eu ganhei duas vezes. Ele me convidava para sua casa e me aconselhou a ir para Paris. Ele escreveu uma carta de recomendação para Fernand Léger. »

Em poucos meses, Krajcberg adquiriu uma boa cultura sobre a Arte Moderna e os principais movimentos artísticos. « Lá, aprendi tudo sobre a Bauhaus, sobre os grandes movimentos da Arte Moderna: discutíamos Cubismo, Cézanne... Depois do que vivi, me sentia mais próximo do Expressionismo do que do Concretismo. » Ele estava convencido de que deveria continuar por esse caminho. A arte agia sobre ele como uma forma de redenção.

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© Juan Esteves 

Montparno pós-guerra

Em Paris, Fernand Léger o acolhe por três meses. No entanto, Krajcberg logo percebe que a Europa não o ajudará a recomeçar a vida. Ele precisa mudar de vida, radicalmente. Marc Chagall, cuja família ele conheceu em Vitebsk, o ajuda a dar esse novo passo. Uma amiga dele trabalha com imigração e sugere que ele parta para o Brasil. A lei brasileira aceita a imigração de mulheres estrangeiras, casadas ou prestes a casar.

Ela conhece uma jovem húngara, cuja família rica se diz disposta a pagar a passagem dela em troca de um “noivado branco”. Frans Krajcberg aceita, sem sequer saber onde fica o Brasil. Eles viajam, ele em terceira classe, ela em primeira. Krajcberg nunca mais verá sua “prometida”. Ele desembarca no Rio de Janeiro em 1947, onde começa uma nova vida em terra desconhecida. Frans Krajcberg tem 26 anos; tudo precisa ser reinventado.

A descoberta do Brasil

Ao chegar no Rio, sem um tostão no bolso, Frans Krajcberg dormia na praia de Botafogo. Em 1948, ele vai para São Paulo, onde Francisco Matarazzo acabara de abrir o Museu de Arte Moderna. Este último contratou Krajcberg como ajudante de carga e descarga. Muito rapidamente, Krajcberg passou a frequentar os círculos artísticos da cidade. Ele convivia com os "pintores autodidatas" da Família Artística Paulista: Volpi, Cordeiro, Mário Zanini… que o introduziram no ateliê de Osir Arte, onde executava os azulejos encomendados a Portinari para as grandes obras arquitetônicas do Modernismo.

Em 1951, Krajcberg coordenou a montagem da Primeira Bienal de São Paulo, onde Max Bill recebeu o Grande Prêmio. No ano seguinte, Bill seria o líder e um dos fundadores, junto com Cordeiro, do Concretismo brasileiro. Nesse mesmo ano, Frans Krajcberg se isolou para pintar em Itanhaém, uma vila litorânea, na casa de Mário Zanini, que o visitava regularmente junto com Alfredo Volpi. Esse período inspirado na paisagem foi exposto no Museu de Arte Moderna, mas Frans Krajcberg não vendeu nada. Reflexo da guerra, miséria material, a vida em São Paulo era dura para ele. Ele sentia que havia “perdido toda a identidade moral”.

Em 1952, Lasar Segall estendeu a mão para Frans Krajcberg. Comprou um desenho dele e o enviou para a papelaria administrada pela família Klabin em Monte Alegre, no Paraná, ao sul de São Paulo. Esse foi o primeiro contato do artista com a natureza brasileira. Um verdadeiro choque! Frans Krajcberg ficou deslumbrado diante daquela floresta selvagem e luxuriante! Ele deixou a papelaria e se isolou para pintar na floresta. Pouco a pouco, em contato com a natureza, ele renasceu.

“Desde que saí de Stuttgart, eu era um homem perdido (...) Eu odiava os homens. Eu os evitava (...) Mas, isolamento por isolamento, por que viver? A natureza me deu força, me trouxe prazer em sentir, pensar, trabalhar. Sobreviver. Eu caminhava pela floresta e descobria um mundo desconhecido. Descobria a vida. A vida pura: ser, mudar, continuar, receber a luz, o calor, a umidade. A vida verdadeira: quando estou na natureza, penso verdadeiramente, falo verdadeiramente, questiono verdadeiramente. Quando a observo, sinto como tudo se move: nasceu, morreu, a continuidade da vida. Eu construí minha casa na floresta. Um gato selvagem me adotou. Eu colecionava orquídeas. Provavelmente tive a maior coleção de orquídeas do Brasil.”

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Alfredo Volpi, Mario Zanini, Bruno Giorgi, inconnu et Frans Krajcberg à São Paulo en 1950

Durante dois anos, Frans Krajcberg viveu de suas criações em cerâmica: potes, azulejos, estatuetas. Ele pintou seu autorretrato, naturezas-mortas e vegetais.

Frans Krajcberg vivia numa floresta gerida de forma ecológica, mas não suportava ver aos poucos a natureza do Paraná sendo destruída pelo fogo e pela exploração humana. Em 1955, sua própria casa na floresta queimou em um incêndio criminoso. Seus desenhos, pinturas, criações em cerâmica e sua rara coleção de orquídeas foram consumidos pelo fogo. Novamente, Frans Krajcberg perdeu tudo.

Ele voltou para o Rio, onde dividiu um ateliê com Franz Weissmann. Expos conjuntamente com Milton Dacosta e Maria Leontina na Petite Galerie, no Rio, e sozinho na Biblioteca Pública do Paraná. Começou a pintar uma série de paisagens abstratas, as “Samanbaias” (samambaias), reminiscências do Paraná. Trabalhou redes lineares de densidade vegetal sobre fundos em tonalidades azuis, que começou a realçar com terra, deixando aberturas de luz.

Em 1957, Frans Krajcberg ganhou o prêmio de melhor pintor brasileiro na Bienal de São Paulo, que consagrou Frans Weissmann como melhor escultor. Jackson Pollock recebeu o grande prêmio. Frans Krajcberg adquiriu a nacionalidade brasileira no ano seguinte. Subitamente famoso, ele vendeu suas telas e voltou a Paris.

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Samambaia, óleo sobre tela, 1955, 71 x 59 cm

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Frans Krajcberg e Samambaias, 1952-54

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Samambaia, óleo sobre tela, 1955, 60 x 49 cm

Na França, Frans Krajcberg se viu imerso no debate intelectual e artístico do final dos anos 50: a guerra da Argélia, a crise da École de Paris e as polêmicas da Abstração. Intoxicado por terebintina, ele parou de pintar. Começou a direcionar suas pesquisas para um contato mais imediato com a matéria. Fez colagens e xilogravuras em papel japonês, realizando suas primeiras "impressões diretas" em madeira, segundo a técnica do papel moldado.

“Tive muita sorte ao chegar em Paris, pois consegui sobreviver. Tive alguns colecionadores... Vendi para Rosa Fried, para sua galeria em Nova York, todas as guaches que fiz no meu quarto de hotel. Foram principalmente para aqueles com quem eu trocava minhas telas por comida, nos restaurantes: La Coupole e em frente, o húngaro Patrick. Na La Coupole, conheci Sartre e Giacometti, que eu admirava muito. Ainda o admiro. Ele é o último a ter feito algo com a figura humana: ele concentra toda a expressão nas suas pequenas cabeças. Em Paris, falava-se principalmente do Tachismo: Soulages, Hartung, o gesto. E eu assisti à morte do Tachismo. Paris estimula, mas eu me sentia perdido lá. Eu havia parado de pintar. Já no Rio, a intoxicação por terebintina me afetava. Fugi para trabalhar.”

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Depois de um ano, Frans Krajcberg sente cada vez mais a necessidade de trabalhar com materiais naturais, o mais próximo possível da beleza dos elementos que o cercam. Em 1958, ele parte para Ibiza, onde retorna regularmente até 1964. Vive de quase nada, em uma caverna próxima ao mar, e começa a fotografar a natureza, exercitando diariamente seu olhar e aguçando sua sensibilidade. Realiza suas primeiras "impressões de pedras e terras" e quadros com elementos naturais. Conhece o crítico Pierre Restany, que escreve: «A natureza é seu ateliê... Ela é seu estudo e seu meio». Impressões diretas, assemblagens ou tratamentos cênicos... ele é um precursor marginal da Arte Povera.

Em 1955, Frans Krajcberg recebe do Presidente Juscelino Kubitschek o prêmio de Melhor Pintor na Bienal de São Paulo.

« Fugi para trabalhar. Parti para Ibiza. E pela primeira vez senti a necessidade de tocar a matéria, não a pintura. Fiz impressões de terra e pedras. Depois comecei a colar a própria terra diretamente. Isso parece uma espécie de Tachismo. Mas não é. Não é uma pintura jogada. Não há gestualidade pictórica. São impressões, registros. Pedaços da natureza. Depois disso, não podia mais trabalhar em Paris. Onde encontrar minha terra? »

Ele parte para a Amazônia pela primeira vez.

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1960, Frans Krajcberg em Ibiza, impressão de pedra em andamento

Em 1960, Frans Krajcberg foi feito cidadão honorário do Rio de Janeiro, onde recebeu as chaves da cidade. No ano seguinte, participou em Paris da exposição Reliefs organizada por San Lazzaro, que dirigia a Galeria e a Revista do Século XX. Jean Dubuffet, a quem admirava, apreciou suas matérias. Georges Braque tornou-se seu amigo e mentor. Eles colaboraram em duas litografias, e Braque integrou uma delas em sua última “tela de papel colado”.

«Gostei da insolência dos Novos Realistas e da liberdade deles. Queriam sair da máquina formal da Abstração sem voltar à figura. Queriam sair dos gestos da pintura. E ousaram o gesto de mostrar. Mostrar o quê? A natureza das cidades. (…) O artista não deve apenas ir à natureza, mas participar de sua época (…) Hoje, a representação humana serve à publicidade e à imagem eletrônica (…) a segunda natureza das cidades deles não é a minha. Por isso, nunca tentei entrar para o grupo dos Novos Realistas, que eu conhecia bem. Pertencio à minoria que sabe da importância da natureza no destino dos homens, portanto meu trabalho a expressa.»

No mesmo ano, Krajcberg conheceu Michèle, uma francesa com quem viveu durante quatro anos. Fez amizade com o fotógrafo-repórter Roger Pic, que morava na alameda de Montparnasse.

Ele fez uma segunda viagem à Amazônia.

Em 1964, suas impressões e suas pinturas feitas com terras e pedras permitiram a Frans Krajcberg ganhar um prêmio na Bienal de Veneza, que naquele ano concedeu o Grande Prêmio ao americano Robert Rauschenberg.

Convidado para Minas Gerais, ele retorna ao Brasil e instala seu atelier aos pés do pico de Itabirito, entre os campos de minério de ferro cujas terras são pigmentos puros. É um deslumbramento de cores. Frans Krajcberg realiza suas primeiras macrofotografias e utiliza os pigmentos naturais para realçar suas obras feitas com madeiras mortas recolhidas. Ele trabalha suas telas aplicando terra e cola misturadas sobre papel seco ao sol, que depois redesenha.

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© Vilma Slomp, Frans Krajcberg em Minas Gerais

« As montanhas eram tão belas que comecei a dançar. Elas passam do preto ao branco por todas as cores. As ondas convulsivas da vegetação crescendo entre as rochas me maravilhavam. Eu estava deslumbrado com tanta beleza e me perguntava como fazer uma arte tão bela. A gente se sente pobre diante dessa riqueza. Isso me angustiava, eu tinha medo. Minha obra é uma longa luta amorosa com a natureza. Eu podia mostrar um fragmento dessa beleza. Eu fiz isso. Mas não posso repetir esse gesto infinitamente. Como fazer meu esse pedaço de madeira? Como expressar a consciência que tenho dele? Onde está minha participação nessa vida que me inclui e me transcende? Até agora, não dominei a natureza. Aprendi a trabalhar com ela. (...). Descobri a cor, as terras de pigmentos puros, cores que são matérias. Há centenas delas: ocre, cinza, marrom, verde, uma imensa gama de vermelhos. Desde 64, todas as minhas cores vêm de Minas. (...) Eu recolhia madeiras mortas nos campos de minério e fiz minhas primeiras esculturas colorindo-as com essas terras. Queria lhes dar uma outra vida. Esse é meu período ingênuo e romântico ».

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© Frans Krajcberg, Minas Gerais

No início dos anos 1960, Frans Krajcberg instala seu atelier parisiense no Chemin du Montparnasse, em Paris — uma alameda onde hoje fica o Espaço Frans Krajcberg. Ele desenvolve suas técnicas de xilogravura e impressões gravadas diretamente na madeira, além de uma série de quadros-assemblages a partir de flores que esculpe e cobre com pigmentos naturais de cor vermelha.

Em 1965, durante um café nos Dois Magots, seu amigo José Zanine Caldas lhe fala sobre a pequena vila de Nova Viçosa, no estado da Bahia. Lá, ele organiza um projeto multidisciplinar reunindo artistas e intelectuais como o arquiteto Oscar Niemeyer e o cantor Chico Buarque de Holanda.

Eles desejam criar um movimento artístico em resposta à uniformidade tecnocrática do estilo internacional, buscando inspiração diretamente na riqueza oferecida pelos materiais locais. No Brasil, é claro que a madeira se impõe!

Esse enraizamento na matéria e na memória se assemelha ao “Tropicalismo”, movimento que então ganhava força nas artes. Encantado, Frans Krajcberg parte para Nova Viçosa, sua floresta e seu litoral. Ele constrói seu primeiro atelier com projetos elaborados por Zanine e ali se instala, ficando sozinho. O grande sonho utópico do grupo não resistiu ao isolamento do lugar.

Para saber mais sobre seu atelier-casa suspenso no topo de uma árvore, clique aqui.

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© Tim Carrol

Frans Krajcberg começa a trabalhar em Paris em suas "sombras recortadas". Trata-se de captar os jogos de luz sobre elementos naturais cujas formas o fascinam. A sombra é desenhada e depois recortada em uma base de madeira. Nas primeiras peças, o recorte com geometria rígida, "construtiva" ou "concretista", contrasta com a fluidez das linhas naturais da forma que ele ressalta. Com o passar dos anos, essa geometria se aproxima cada vez mais da forma, como a essência de uma iluminação lateral.

«A ideia surgiu para mim em Minas, mas foi em Paris que fiz minhas primeiras sombras projetadas. Eu queria estourar o quadrado, sair do quadro. Tinha mais de uma razão para isso. A natureza ignora o quadrado, o movimento gira. (…) A vida não é quadrada e não tem formas fixas. (…) A abstração do quadrado acompanhou as revoluções do início do século, assim como o Expressionismo acompanhava a miséria. Sempre tive uma sensibilidade expressionista e nunca me reconheci no Concretismo. Não queria arte pela arte. Queria encontrar formas novas. A natureza me oferecia milhares delas.»

«Devo mais às madeiras recortadas de Arp do que aos recortes de papel de Matisse. (…) Minha pesquisa consistia em experimentar iluminações para escolher uma sombra. Existem infinitas. Nenhum homem faz a mesma sombra e a sombra do mesmo homem está sempre mudando. Eu queria unificar o objeto com sua sombra.»

Eu buscava reencontrar o objeto em sua sombra. Procurava na natureza uma possibilidade de renascer para a vida da arte, unindo-me a formas diferentes, mas captadas dela. A sombra projetada lhe acrescentava uma forma. Essa era a minha participação.

Em 1967, Frans Krajcberg casou-se com Alba, uma jovem brasileira da Bahia, filha de médicos ricos de Salvador. Estudante de História da Arte, ela escrevia uma tese sobre Vassily Kandinsky. O casal se separou três anos depois.

Em 1969, Frans Krajcberg foi convidado para a exposição Arte e Matéria, em Montreal.

Entre 1972 e 1974, Frans Krajcberg instalou-se em Nova Viçosa. Ali, realizou suas primeiras "madeiras polidas", montagens de madeiras mortas das quais destacava linhas arquitetônicas: árvores ocos ou manguezais, devorados pela luz. Quando vi os manguezais, fiquei impressionado. Venho do Tachismo, da Abstração de Paris. Como captar a vida dessas formas, suas mudanças e vibrações? Soto conseguiu isso na obra "penetrável", na frente do Museu de Arte Moderna de Paris. Nessa vibração branca, eu reencontrava a floresta amazônica.

Frans Krajcberg também fez suas primeiras "impressões de areia", moldadas diretamente na praia durante a maré baixa. Frente ao mar, observava durante horas o vai-e-vem das ondas e a força alternada dos ventos. Ao se retirar, a água inscreve na areia um repertório ilimitado de sulcos e ondulações. Em papel japonês, sem cola, ele reproduz as impressões da natureza diretamente no gesso, antes de imprimi-las no verso do papel. Elas revelam a textura do solo, "a pele do mundo", em seus mínimos detalhes. Dessa natureza viva — areias e, depois, vegetais — resta uma inscrição matricial que restitui, grão por grão, a matéria e a cena original, para sempre memorizadas. A impressão é então aplicada em tela ou madeira.

A ausência de moldura e margem acentua a originalidade de uma obra "bruta", distante da pintura de cavalete. Retirado de sua horizontalidade para ser exposto verticalmente, o objeto da natureza torna-se um artefato artístico que imortaliza uma existência destinada à desaparição. Para Frans Krajcberg, é uma forma de lamentar isso diante do mundo. Nessa abordagem, ele foi o primeiro a usar a interpenetração da pintura e da escultura de forma tão completa. Sua intervenção artística permite que elas se encontrem o mais próximo possível, numa exaltação recíproca que Paul Klee chamava “a alma da criação”!

Em 1975, Frans Krajcberg foi convidado para expor suas obras em Paris, no Centro Nacional de Arte Moderna, Georges Pompidou, ainda em fase de construção. Foi a primeira exposição organizada sob sua marca. Ele conheceu Claude Mollard, então Secretário-Geral do Centro Pompidou. Pierre Restany redigiu o catálogo da exposição, que foi amplamente elogiada pela crítica. Houve debates apaixonados com o público, que reforçaram em Frans Krajcberg a vontade de criar não apenas para mostrar a natureza esquecida, mas para denunciar a natureza ameaçada pela expansão mundial da terceira revolução tecnológica.

“Algo estava mexendo dentro de mim. Um caminho continuava. Os debates do CNAC o esclareceram. Eles aconteciam duas vezes por semana, após a projeção dos meus slides. Percebi ali que a era da Arte pela Arte havia acabado, e que eu queria que minhas esculturas fossem testemunhas desse desastre.

Minha escultura tornou-se engajada. Quero expressar minha revolta. Há apenas uma solução para o artista moderno. Ou sua arte participa da nossa terceira revolução industrial, a da eletrônica, e com isso ele se compromete com o progresso, ou luta contra as consequências, contra essa poluição que é tão temível quanto as bombas atômicas.

É preciso escolher, e eu escolhi lutar, me expressar não mais apenas com a beleza das formas da natureza, mas com essa natureza que estamos fazendo morrer. Minhas esculturas hoje são como um memorial desse desastre que eu vejo e no meio do qual vivo.”

Exposition de 1975, Visiteur devant l'oeuvre Fragment écologique n°5, bois, 235 x 152 x 43

Frans Krajcberg está cada vez mais sensível à destruição da floresta amazônica pelo fogo provocado pelo homem. Seu trabalho é árduo, sua dor está sempre à flor da pele. As feridas abertas pela destruição de sua família durante a guerra se agravam ao ver hectares de floresta desaparecerem diante de seus olhos.

Ele instala em frente à sua própria casa uma enorme escultura de onze metros de altura, batizada de “Memória da Destruição”.

Vazios de sua substância, dois troncos de árvores mortos, secos e queimados, estão encaixados um no outro e erguidos em direção ao céu. Sua silhueta dramática fala do luto vegetal, mas também do corpo humano, reminiscência e recusa do esquecimento do passado. Como os ancestrais africanos, enterrados no coração das casas para proteger os vivos da tribo, essa escultura funciona como um guardião espiritual do espaço privado do artista.

Em uma convivência harmoniosa com a floresta, Frans Krajcberg ocupa seu território como uma aldeia indígena. Ali ele cria. E do lado do mar, ele “exibe” suas esculturas para fotografá-las de frente para o oceano, como em um museu natural.

Em 1976, ele parte para o Mato Grosso, na Amazônia, com Sepp Baendereck, que conhecera no ano anterior. Compartilham a mesma paixão pela defesa da natureza e permanecerão unidos por essa causa até a morte de Baendereck, em 1989. Juntos, farão três expedições amazônicas (1976-77-78) e três viagens ao Mato Grosso (1985-86-87).

 

Com Pierre Restany, Krajcberg viaja pelo Minas Gerais e pelo Piauí.

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© Tim Carrol

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Foto da Amazônia, Brasil. Todos os direitos reservados.

​Pierre Restany e Frans Krajcberg

« A natureza originária deve ser exaltada como uma higiene da percepção e um oxigênio mental: um naturalismo integral, gigantesco catalisador e acelerador de nossas faculdades de sentir, pensar e agir. »

« A noção de naturalismo é a expressão da consciência planetária (…) a opção naturalista, oposta à opção realista, é fruto de uma escolha que compromete a totalidade da consciência individual. Essa opção não se limita a expressar o temor do homem diante do perigo que o excesso da civilização industrial representa para a natureza. »

« O naturalismo integral é uma resposta. E justamente por sua virtude de integralismo, isto é, de planetarização da consciência, apresenta-se hoje como uma opção aberta, um fio condutor no caos da arte atual. »

Pierre Restany, Manifesto do Rio Negro, 1978 (trechos).

Em 1978, Pierre Restany uniu-se a Sepp Baendereck e Frans Krajcberg para uma expedição à Amazônia. Enquanto subiam o Rio Negro, Restany redigiu o Manifesto do Naturalismo Integral, ou Manifesto do Rio Negro. Nele, explorou sua própria visão da Arte confrontada à estética “alternativa” de Frans Krajcberg, baseada tanto na reflexão quanto no instinto. As conferências de lançamento no Rio, São Paulo e Brasília geraram grande polêmica.

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« A natureza amazônica questiona minha sensibilidade como homem moderno. Ela também coloca em dúvida a escala dos valores estéticos tradicionalmente reconhecidos. O caos artístico atual é a consequência da evolução urbana. Aqui, estamos diante de um mundo de formas e vibrações, do mistério de uma mudança contínua. Devemos saber aproveitar isso. A natureza integral pode dar um novo significado aos valores individuais de sensibilidade e criatividade. »

Pierre Restany, Minas Gerais, 1976

“Lançamos o Manifesto do Rio Negro no dia em que o Brasil se abria à democracia: os militares tinham acabado de anistiar os opositores. Foi o primeiro debate após a ditadura, nunca se tinha falado da destruição das florestas. Os ataques foram violentos. Alguns não aceitavam que três ‘gringos’ falassem sobre o Brasil. O manifesto foi apresentado em Curitiba, Nova York, Paris, Roma e Milão.” — FRANS KRAJCBERG.

Para ler o Manifesto completo de Pierre Restany, clique aqui.

Em 1980, Frans Krajcberg começa suas impressões vegetais policromáticas em Nova Viçosa. Em 1982-1983, após uma viagem à região de Belém, ele cria monumentais "trançados de vime", inspirados no artesanato local que deixam a luz passar naturalmente.

Mas um choque decisivo ocorre em 1985, durante uma primeira viagem ao Mato Grosso, região selvagem e exuberante no centro do Brasil. Ele assiste impotente aos incêndios voluntários provocados pelos grandes proprietários para desmatar terras destinadas à pecuária extensiva. Revoltado, realiza um longo registro fotográfico das florestas em chamas — "Queimadas" — mostrando sem ambiguidades o papel do Homem nessa destruição massiva.

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© Sepp Baendereck, Frans Krajcberg no Mato Grosso, 1984

Frans Krajcberg é, e será daqui em diante, um militante ativo que mostra e denuncia incansavelmente. O Artista traz dessa viagem troncos secos de palmeiras, dos quais realiza vários conjuntos de esculturas, os "conjuntos". Bastões de chuva ou totens, eles denunciam o desmatamento, assim como fizeram suas fotografias. A inspiração indígena atravessa esses troncos na vertical, estriados de luz e sombra, que ele reúne na floresta.

Eu sempre me pergunto por quê, como me perguntava quando criança. Por que o homem destrói as riquezas naturais quando sabe que o planeta está se esgotando e que, sem elas, sua própria vida será impossível? Por que o Brasil está se desertificando sendo um dos países mais ricos do planeta? Por ganhos imediatos de terras, destrói-se suas florestas, destrói-se a longo prazo, ao lado de uma miséria negra. A sociedade é uma máquina comercial e o pensamento artístico nela afundou. Onde está o artista nesses problemas?

No ano seguinte, ele publica seu livro de fotografias Natura e retorna ao Mato Grosso para continuar sua luta.

Eu busco formas para o meu grito

 

En 1987, Frans Krajcberg fait son troisième voyage dans l’État du Mato Grosso. Le réalisateur Walter Salles l’y rejoint pour tourner un film sur sa vie : Krajcberg, Poète des Vestiges (45 minutes), qui remportera le prix du meilleur documentaire au festival dei Popoli à Florence. « Krajcberg fut la plus grande influence de ma vie », déclarera Walter Salles à la mort de l’artiste.

L’œuvre entière de Krajcberg s’engage désormais résolument dans la lutte environnementale. Pour exprimer sa révolte, il puise son inspiration dans les formes offertes par la nature malmenée. Il veut alerter, dénoncer, hurler au monde les ravages causés par la destruction, en redonnant vie aux éléments naturels.

« Je montre la violence contre-nature faite à la vie. J'exprime la conscience planétaire révoltée. La destruction a des formes, bien qu'elle parle de l'inexistant. Je ne cherche pas à faire de la sculpture. Je cherche des formes à mon cri. Cette écorce brûlée, c'est moi. Je me sens dans le bois et les pierres. Animiste ? Oui. Visionnaire ? Non, je suis un participant de ce moment. Mon unique pensée est d'exprimer tout ce que je ressens. C'est une lutte énorme. »

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© Frans Krajcberg, Mato Grosso, 1980

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« Pintar a música pura não é fácil. Como fazer uma escultura gritar como uma voz? Que haja na minha obra reminiscências culturais, reminiscências da guerra, no inconsciente, certamente. Com todo esse racismo, esse antissemitismo, eu não podia fazer outra arte. Mas eu expresso, sobretudo, o que vi ontem no Mato Grosso, na Amazônia ou no Estado da Bahia.»

© Frans Krajcberg, Mato Grosso, 1980

Eu sou um homem queimado

 

« Eu sou um homem queimado. O fogo é a morte, o abismo. O fogo está comigo desde sempre. Minha mensagem é trágica. Eu mostro o crime. Trago os documentos, os reúno e adiciono mais, quero dar à minha revolta o rosto mais dramático e violento. Quero que minhas obras sejam um reflexo das queimaduras ».

No final dos anos 1980, após suas viagens pelo Mato Grosso e pela Amazônia, Frans Krajcberg começa a trabalhar com "madeiras queimadas", recolhidas nos locais de desmatamento. Suas "Revoltas" são assemblagens feitas a partir de elementos naturais queimados — troncos, cipós, raízes... recolhidos nas florestas devastadas pelos incêndios, e depois transformados com maçarico. O fogo endurece a madeira e lhe confere certa resistência. A obra é depois realçada com preto ou vermelho, cores extraídas do carvão vegetal, pedras ou pigmentos naturais, que protegem, curam e camuflam como pinturas de guerra.

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Erguidas sobre bases naturais, atravessadas pela luz, suas "madeiras queimadas", estelas ou totens, soam como trágicos sinais de alarme. Com elas, Frans Krajcberg afirma que a morte não é um fim. Ele a desafia com suas esculturas. Os elementos purificados, transformados e magnificados renascem. Suas "casacas queimadas" ecoam suas "madeiras queimadas". Entre pintura e fragmentos epidérmicos, sua economia trágica contrapõe-se ao teatralismo dos "conjuntos".

O Testemunho

 

Frans Krajcberg está profundamente revoltado com a destruição criminosa da floresta amazônica, que queima dia e noite, preenchendo o horizonte com fumaça negra. “O massacre que vi na floresta amazônica, nunca vi em outro lugar, nem mesmo durante a guerra.” Ele foi o primeiro artista renomado a usar suas fotografias e esculturas para denunciar ativamente esses incêndios. Além disso, defende fervorosamente os habitantes da Amazônia, com quem se sente próximo pelas tradições, modo de vida e arte.

Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes, o primeiro a defender uma consciência ecológica no Brasil e além das fronteiras, foi assassinado. Suas ações permitiram salvar cerca de 1.200.000 hectares de florestas. Frans Krajcberg presta-lhe homenagem esculpindo uma seringueira ferida, marcada por linhas vermelhas profundas que evocam sangue. Uma placa comemorativa em madeira queimada traz o nome do militante mártir.

Em Rio Branco, no estado do Acre, Frans Krajcberg fotografa incansavelmente a floresta devastada e recolhe elementos dispersos para suas esculturas. Ele tenta convencer os agricultores a desistirem de derrubar as árvores, o que lhe valeu várias ameaças de morte. Conhece o "Cacique" (líder espiritual) indígena Raoni e compromete-se ao seu lado para defender a causa dos povos indígenas da Amazônia, com quem mantém laços de amizade e militância até sua morte.

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Minha obra é um manifesto

 

Desde os anos 1980, a notoriedade de Frans Krajcberg permite-lhe atuar no cenário internacional e afirmar-se como artista militante. Ele é convidado a expor seu trabalho em todo o mundo. Apresenta suas “Revoltas” em Cuba, Nova Iorque e Estocolmo. Em 1988, participa do simpósio sobre meio ambiente em Seul e, como artista, do movimento “Médicos Sem Fronteiras” na Romênia.

Nos anos 1990, seu trabalho “ecológico” alcança reconhecimento. Em 1990, é convidado a Moscou para o Congresso Internacional de Ecologia. É a primeira vez que volta à Rússia desde seus estudos na Academia de Belas Artes de Leningrado. Em 1992, os Museus de Arte Moderna de Salvador e do Rio de Janeiro lhe prestam homenagem. No Rio, sua exposição “Imagens do Fogo”, durante a Conferência Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente, atrai mais de 300.000 visitantes. Em Paris, a exposição “Américas Latinas”, no Centro Georges Pompidou, apresenta várias de suas obras. Em 1996, está no centro da exposição “Villette-Amazone”, na Grande Halle de la Villette. Sob a responsabilidade de Jacques Leenhardt e Bettina Laville, a exposição é um manifesto que coloca o meio ambiente como desafio prioritário para o século XXI. Em 1998, expõe na Fundação Cartier, na exposição “Ser Natureza”.

Muito à frente na consciência dos desafios planetários, o papel de Frans Krajcberg nas décadas de 1980 e 1990 o inscreve hoje como um dos pais do movimento Antropoceno, que atribui ao Homem um papel determinante no equilíbrio planetário. O artista, por sua vez, está “no centro de todo projeto de civilização, integral e radicalmente”. A Arte permite transformar a sociedade. Ao longo de toda a sua vida, Frans Krajcberg sonhou com gestos artísticos radicais: “O gesto absoluto seria descarregar, tal como são, numa exposição, um caminhão de madeira queimada, recolhida no campo. Minha obra é um manifesto. Eu não escrevo: não sou político. Tenho que encontrar a imagem. Se eu pudesse espalhar cinzas por toda parte, estaria o mais próximo possível do que sinto”.

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Fotos da exposição “Diálogos com a Natureza”, Bagatelle, 2005

O Grito pelo Planeta

Em 2003, Frans Krajcberg foi homenageado na exposição "Arte e Revolta", organizada no novo Museu do Montparnasse, localizado na mesma rua onde ficava seu atelier. Thérèse Vian Mantovani foi a curadora da exposição. Ele doou um conjunto de obras emblemáticas à cidade de Paris, que passaram a ser expostas no Espaço Frans Krajcberg, na avenida du Maine, nº 21, inaugurado pelo prefeito de Paris, Bertrand Delanoë, em dezembro.

Em Curitiba, no Paraná, foi inaugurado um museu com seu nome no jardim botânico. Em Nova Viçosa, ele construiu um pequeno museu próximo à sua casa. Também lançou a segunda edição de seu livro "Natureza e Revolta".

Em 2005, ano do Brasil na França, a cidade de Paris organizou uma grande exposição retrospectiva no Parc de Bagatelle. Intitulada "Diálogos com a Natureza", a exposição homenageou e deu voz tanto ao artista quanto ao militante. Frans Krajcberg trabalhou em estreita colaboração com Sylvie Depondt, comissária geral, produtores brasileiros e equipes dos parques e jardins. Cerca de cem obras foram transportadas por navio desde Nova Viçosa. Os "madeiros queimados" foram expostos pela primeira vez ao ar livre. Grandes totens se destacavam nos gramados, erguidos diante das árvores do Bois de Boulogne. Debates franco-brasileiros sobre o papel das florestas urbanas e periurbanas foram organizados, com participação ativa de Paris, Rio e São Paulo.

 

Gilberto Gil, então Ministro da Cultura do Brasil, convidado para o evento, chamou "cada um de nós a reconsiderar a Natureza por meio da Arte". A exposição e os debates tiveram enorme sucesso, com 450 mil visitantes. Para Frans Krajcberg, foi a ocasião para lançar seu Grito pelo Planeta: um apelo militante e artístico para despertar as consciências adormecidas.

Para mais informações sobre a exposição em Bagatelle, clique aqui.

Na ocasião, foi transmitido na France 5 o filme documental "Retrato de uma Revolta", dirigido por Maurice Dubroca e produzido por Eric Darmon, Mémoire Magnétique productions (2004, 52 min), prêmio UNESCO de documentário 2004.

Para assistir ao documentário, clique aqui.

No mesmo ano, uma escultura em bronze foi instalada na Praça da Vaca Negra, em Arcueil, e uma obra foi colocada na Embaixada do Brasil, na exposição "Entre Duas Luzes".

O Reconhecimento

Em 2008, Frans Krajcberg recebeu o título de "Cidadão Baiano" pelo Estado da Bahia. Seu livro de fotografias Queimadas, que denuncia claramente os malefícios do desmatamento, foi publicado com o apoio do Governo.

Ele participou da exposição O Grito – Ano Mundial da Árvore no Palacete Das Artes Rodin, na Bahia. Em São Paulo, expôs no Parque Ibirapuera e na OCA, para comemorar os 60 anos do Museu de Arte Moderna da cidade, e participou de todas as bienais. Recebeu o prêmio de Melhor Exposição do Ano pela Associação de Críticos de Arte e obteve o título de "Cidadão Paulistano".

Em 2011, expôs no Museu de Arte Contemporânea de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro.

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Em 2012, sua obra esteve presente em João Pessoa, na exposição Natureza Extrema, por ocasião da inauguração do Museu Estação Cabo Branco. Ele recebeu o Grande Prêmio Enku em Gifu, no Japão, e a Medalha de Vermeil da Cidade de Paris foi-lhe entregue em reconhecimento a toda sua obra.

Em 2016, em São Paulo, foi o artista homenageado da 32ª Bienal.

Em 2016-2017, em Paris, o Museu do Homem convidou Frans Krajcberg como o “primeiro alerta” nas salas recém-renovadas. Suas obras foram instaladas na seção dedicada a “Para onde vamos?” e provocaram questionamentos e debates. Encontros sobre sua vida e obra foram organizados. O Espaço Frans Krajcberg recebeu performances e trabalhos dos pesquisadores do Museu do Homem

O Manifesto do Naturalismo Integral

O “Grito pela Planeta”, lançado em Bagatelle em 2005, continua a reunir militantes e personalidades do mundo da Arte e da Cultura em torno da luta de Frans Krajcberg pela defesa do meio ambiente. Mas o destino da Amazônia permanece no centro de suas preocupações. Em 2011, ele lança um “Grito de esperança pela Amazônia” e co-assina uma carta aberta à ONU para a criação do Ano Internacional da Amazônia, junto com outras personalidades (Thiago de Mello, João Meirelles, André Trigueiro, Christiane Torloni, Vitor Fasano, Regina Jeha e Mario Mantovani).

Em 2013, 35 anos após o “Manifesto do Rio Negro” de Pierre Restany, Frans Krajcberg e Claude Mollard lançam o “Novo Manifesto do Naturalismo Integral”. O texto reafirma o papel primordial do Artista na defesa da Natureza. Diante da globalização ameaçadora, eles radicalizam os termos do primeiro Manifesto. Reivindicam o direito à diversidade e o dever de respeitar o planeta: integral e radicalmente! Os artistas são cidadãos do mundo. Como tais, devem, buscando sua inspiração o mais próximo possível da Natureza, criar um movimento capaz de sensibilizar a opinião pública.

Para saber mais sobre o “Novo Manifesto do Naturalismo Integral”, clique aqui.

Em 2015, por ocasião da COP 21, o Artista lança um grande movimento na França e no Brasil com a associação Akiri para fazer ecoar seu “Grito pela Planeta”. França, Brasil e Peru, com representantes dos povos indígenas e artistas, unem-se para pedir que a proteção da floresta Amazônica, guardiã do equilíbrio ecológico, climático e cultural da nossa Terra, tenha lugar nas negociações climáticas que devem ocorrer em Paris em dezembro de 2015.

Exposições, conferências, colóquios e projeções são organizados para dar voz aos povos da floresta amazônica, em parceria, entre outros, com o Museu do Quai Branly, a Fundação Yves Rocher e a SNCF, Yann Toma, Anouk Garcia, Oskar Metsavaht, Vincent Carelli... A presença de líderes indígenas e artistas em Paris, que se manifestam pela defesa da floresta amazônica, representa uma oportunidade única para encontrá-los e apoiar seus projetos.

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“Transmitir”

Frans Krajcberg faleceu em 15 de novembro de 2017, no Rio. Suas cinzas agora repousam em Nova Viçosa.

Em 2019, o Espaço Frans Krajcberg, fechado desde sua morte, reabriu com uma nova identidade e uma missão reforçada: continuar a luta de Frans Krajcberg, divulgar e promover sua obra, lutar pela conscientização e pela (re)conexão do Homem com a Natureza. A programação agora reúne, em torno de sua mensagem e obra, todos aqueles que desejam se engajar a serviço da vida, da Arte e do planeta.

Frans Krajcberg passou a vida denunciando. Mas sempre preservou seu olhar de maravilhamento, com olhos e alma em alerta perpétua. Todos os dias, ele exercitava seu olhar de artista e alimentava sua visão engajada fotografando incansavelmente os detalhes daquela Natureza que o fascinava e cuja força de resiliência admirava. Com ele, queremos alertar para despertar consciências e agir para desenvolver a esperança, duas mensagens que ele nos transmitiu e que queremos aqui propagar.

“A floresta é a vida pura. Ser, mudar, continuar, receber a luz, a umidade, a verdadeira vida. Quando olho a natureza, sinto como tudo isso se move: nasce, morre, a continuidade da vida… A natureza questiona minha sensibilidade de artista e de homem.”


— Frans Krajcberg

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© Vilma Slomp

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